Você tem medo de altura?
- Elis Faustino
- 13 de mar.
- 2 min de leitura

Era inverno em Vancouver. O frio não era uma novidade. Eu tinha uma touca de crochê do Hulk que a vovô fez pra mim. Às vezes coçava minha cabeça se eu corria muito. Eu pulava nos morrinhos de neve nas calçadas. Pulava alto para afundar as minhas galochas por inteiro. Me equilibrava nas muretas esticando os braços como um avião. Imaginava o dia que voltaria para o Brasil. Você sabia que da minha casa para a casa da vovô eu preciso pegar dois aviões?
Era inverno em Vancouver. O frio não era uma novidade. Não tinha nada para fazer. Nevava. A mamãe ficou animada quando o céu clareou. As nuvens cinzas, pesadas, esparramadas como um cimento foram embora. Mesmo assim o dia ficou nublado. Sempre tem uma névoa que escorre com o vento. Neste dia o papai parecia mais entediado que eu. Por mim, ficaria em casa assistindo o filme do Godzilla. Ele queria sair, mas disse que ia me levar para passear. Lembro quando subi pela primeira vez a Grouse Montain.
Eu nunca tinha andado de teleférico. Tinha que comprar ingresso, por isso a gente nunca foi. O papai queria praticar inglês. Conversaria com qualquer pessoa, mesmo que fosse com o moço da bilheteria. Puxou assunto. Perguntou até o que já sabia porque pesquisou no celular as atrações. Tinha a cabana para tomar chocolate quente. Onde alugar ski. As trilhas da montanha. Pegou o mapa. Fez piada sobre os ursos. Enquanto o papai tentava fazer um amigo, eu e a mamãe nos aproximamos do teleférico.
A montanha era grande assim que nem dava para ver de tão grandona que era.
─ É lá em cima que a gente vai, mamãe?
─ Lá no topo dá pra ver tudo.
─ Dá pra ver o Brasil?
─ Talvez.
─ A gente vai subir tudo isso?
─ Você está com medo, Luigi?
─ Eu não. Você está com medo, mamãe?
─ Ah, eu estou! Tenho medo de altura...
─ Papai, a mamãe está com medo!
Sabia que o teleférico não para pra a gente entrar? Eu tive que entrar muito rápido na cabine. Dei um pulo. A mamãe segurou minha mão. Quase cai. A mamãe se sentou de costas para montanha. Segurou na barra. Fechou os olhos.
─ A mamãe está com medo! A mamãe está com medo!
Eu me sentei ao lado do papai. De repente, os cabos de aço tremeram com a força do motor. A cabine subiu e subiu. Eu olhei para fora e a gente já estava um tantão assim do chão. Senti um gelado debaixo das costelas:
─ É muito alto, minha Nossa Senhola! Mamãe, ai, nossa! Ai, minha Nossa Senhola!
─ Agora você ficou com medo, Luigi?
─ Não, eu não! Ai, minha Nossa Senhola!




